No setor privado é comum observarmos empresas que concedem descontos ou abatimentos nos seus produtos que estão com prazo de validade próximo do vencimento. Na lógica dessas empresas, é melhor vender um produto com desconto, ainda que generoso, do que perdê-los devido ao fim do prazo de validade.
Ao saber que os produtos com desconto estão próximos ao vencimento, o consumidor poderá decidir se vale a pena comprar estas mercadorias, ainda que com desconto substancial. Nesta situação o consumidor não considera apenas o desconto ofertado, mas também se ele consumirá o produto/bem antes do prazo de validade. Seguindo a lógica inversa da empresa, não adianta o consumidor adquirir um produto com desconto substancial se ele não irá consumi-lo antes do prazo de validade, pois ele desperdiçará seu dinheiro.
Diante desse contexto, percebemos que o prazo de validade de um produto pode influenciar no seu preço (quanto mais próximo do vencimento mais baixo tende a ser o preço) e também na decisão de compra (consumo imediato ou posterior).
Dessa forma, é possível a administração pública prever regras no edital do procedimento licitatório acerca do prazo de fabricação ou validade dos produtos a serem adquiridos? No nosso entender, sim. Porém, dependerá do caso concreto.
Se a licitação for realizada para entrega imediata e consumo instantâneo dos bens, o Poder Público não poderá exigir que as empresas forneçam produtos com prazos determinados de fabricação ou de validade. Nesta hipótese, como o consumo do produto será imediato, ou em curto período de tempo, este tipo de previsão editalícia ensejaria a restrição à competição.
No entanto, se os produtos forem ser armazenados para consumo no médio prazo, entendemos que a administração pública poderá estipular prazos específicos mínimos dos bens, sob pena de alguns deles se deteriorarem antes de serem consumidos, acarretando prejuízo ao erário e responsabilização do gestor público.
Apesar da gestão moderna (just-in-time) indicar que a organização se torna mais eficiente com menos estoques, em razão da redução dos custos de armazenamento, pessoal e desperdício, isto não significa que não possam existir situações em que é preciso armazenar produtos.
Portanto, se a prefeitura demonstrar que a armazenagem dos produtos traz mais benefícios do que a entrega parcelada ou se o interesse público justificar a existência de estoques, poderá ser exigido das empresas, nos editais de licitações, um prazo específico de validade dos produtos. Esta determinação visa evitar prejuízos à sociedade em razão do prazo de vencimento exíguo dos produtos.
Além destes aspectos, cumpre ressaltar que algumas modalidades de licitação são incompatíveis com a exigência de prazo de fabricação ou de validade específico dos produtos, como é o caso do sistema de registro de preços. Esta modalidade licitatória é adotada, dentre outras hipóteses, quando for conveniente a entrega parcelada dos produtos ou quando a administração não souber definir previamente o quantitativo a ser demandado (art. 3, II, IV do Decreto nº 7.892/13). Percebe-se que a natureza do registro de preço é incompatível com a exigência específica de prazo de fabricação ou validade dos produtos.
Por fim, se o gestor decidir fixar um prazo específico de fabricação ou validade para aceitação dos produtos, é importante que este prazo seja justificado objetivamente e que haja razoabilidade no seu estabelecimento, sob pena de restringir indevidamente a competitividade da disputa.
Artigo embasado em 3 (três) decisões de Tribunais de Contas vigentes na data de sua publicação.