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O giro de 180 graus dado pela Lei n.º 13.019/2014 na prestação de contas.

Por: Oscar Moreira*


O Brasil possui mais de 800 mil Organizações da Sociedade Civil (OSC) como registra o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA no Mapa das OSC. As atividades destas organizações sem fins lucrativos têm se mostrado extremamente importante para os brasileiros, pois complementam à atuação estatal. No setor de saúde, 50% das internações feitas pelo SUS ocorrem por meio de OSC.


Mesmo sendo relevantes à sociedade brasileira, a principal demanda destas entidades situa-se na ausência de recursos financeiros para execução de suas ações em prol da coletividade. No Brasil, o Poder Público é o principal financiador das organizações sem fins lucrativos, mas ainda em quantidade e fluxo aquém do necessário.


Em razão dessa realidade, a criação do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), por meio da Lei Nacional nº 13.019/2014 é considerado um divisor de águas no financiamento público das entidades do Terceiro Setor . Desde sua entrada em vigor, o MROSC se tornou a regra geral das parcerias entre as organizações da sociedade civil e a administração pública.


A lei em questão modificou muitos pontos que estavam arraigados na prática da gestão pública municipal brasileira, como a celebração de parcerias com as entidades sem fins lucrativos por meio de convênios. Com a vigência do MROSC estes foram substituídos pelos termos de colaboração e fomento e pelo acordo de cooperação. Contudo, um dos pontos mais inovadores e polêmicos do MROSC se encontra na fase de prestação de contas. Historicamente, esta etapa é o calcanhar de Aquiles das organizações da sociedade civil e também da Administração Pública. A ausência de regras bem definidas emperrava a execução do mandamento constitucional disposto no art. 70 da Constituição de 1988, gerando confusão para os convenentes.

O legislador, sabedor destes pontos negativos, tratou de destinar capítulo próprio à prestação de contas na lei, com objetivo de melhorar a relação entre os parceiros e assim buscar melhores resultados para sociedade brasileira.


Sem a pretensão de esgotar toda a temática que envolve a prestação de contas dentro do MROSC, dois pontos são chaves para entender a nova realidade inaugurada pela legislação em comento. O primeiro é entender que a prestação de contas não é a fase final da parceria. Esse tipo de pensamento limitador produz grandes riscos para as OSC e também para os gestores públicos.


A prestação de contas deve ser pensada antes mesmo da publicação do edital de chamamento público, uma vez que a parceria celebrada tem como objetivo à execução de política pública relevante à sociedade. A prestação de contas é uma das cinco fases de uma parceria (formulação e planejamento; seleção e pactuação; implementação e execução; monitoramento e avaliação; e, prestação de contas) que estão todas relacionadas entre si. Uma boa prestação de contas será consequência natural de um bom planejamento que produziu um chamamento público sem vícios e de um monitoramento bem elaborado.


O segundo ponto a ser destacado, é que o MROSC privilegia o controle de resultados em detrimento de análises financeiras (art. 6º, II, Lei nº 13.019/2014). A priorização por resultados é uma das diretrizes da lei e conduz a mudança de paradigma na prestação de contas. Antes da entrada em vigor do MROSC a regra da prestação de contas dos antigos convênios eram análises financeiras e contábeis realizadas somente ao final da parceria. A nova lei modificou o racional da prestação de contas ao optar pela verificação da execução das ações e o cumprimento de metas contidas nos planos de trabalhos em detrimento das análises meramente contábeis.


A análise financeira da prestação de contas somente ocorrerá quando a organização da sociedade civil não alcançar as metas traçadas no plano de trabalho e os resultados estabelecidos no mesmo, como prescrito no art. 66 do MROSC. Esse giro de 180 graus na forma de pensar a prestação de contas precisa ser internalizado por todos atores sociais envolvidos nas parcerias celebradas sob a égide do MROSC (gestores públicos, OSC, Ministério Público e Tribunal de Contas), para trazer os efeitos positivos idealizados pelo legislador, como economia de tempo e redução de custos com o controle.

Deve ficar claro que o MROSC não abre mão do controle do recurso público, mas o faz sob um novo viés que necessita de monitoramento e acompanhamento diuturno por parte dos gestores públicos perante os planos de trabalho celebrados com as entidades do Terceiro Setor.

Em suma, o MROSC permite a melhoria da relação dos entes públicos e das organizações da sociedade civil em prol da sociedade brasileira. Ademais, a prestação de contas como contida na Lei nº 13.019/2014 está alinhada com as modernas formas de controle baseadas na eficiência e não apenas em notas fiscais que não espelham a realidade fática. Olhar a questão financeira pela ótica de resultados é sem dúvidas um modo de cuidar da verba pública.


*Mestre em Educação Profissional e Tecnológica pelo IFSUDESTEMG, Pós-graduado em Gestão Pública pela FAEL, bacharel em Direito pela Universidade Federal de Viçosa. Consultor e facilitador da Lei nº 13.019/2014 desde 2015, com mais de 1.500 alunos.

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